No processo, a empresa alegava que a quarentena em SP já acabou.
O vice-presidente do TRT da 15ª região, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, indeferiu liminarmente pedido de empresa e assegurou à trabalhadora gestante o direito de permanecer afastada durante a pandemia, sem prejuízo de seus direitos trabalhistas.
No caso concreto, a sentença da 4ª vara do Trabalho de Campinas/SP havia concedido a antecipação da tutela, em favor da reclamante gestante, para manter o seu afastamento, conforme os termos da lei 14.151/21, bem como o pagamento integral da remuneração, das cestas básicas e do tíquete-refeição, inclusive para os meses ainda não quitados.
Contra essa decisão, a empresa reclamada impetrou mandado de segurança, a bem de defender suposto direito líquido e certo de receber os serviços de quem assalaria, uma vez que, em São Paulo, “a quarentena determinada em razão da situação de emergência vigorou até o dia 16 de agosto de 2021, deixando de existir a partir de 17 de agosto de 2021”, de modo que, no seu entendimento, “a lei 14.151/21 deixou de surtir efeitos no Estado”.
E não bastasse, a lei 14.151/21 não imporia ao empregador o pagamento de salários, de modo que, a caber o afastamento, a subsistência da empregada deveria ser garantida pela Previdência Social.
O vice-presidente judicial, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, porém, refutou tais argumentos e indeferiu a pretensão patronal, em juízo de cognição sumária, reportando o que decidido pelo STF na ADIn 6.341 e examinando a condição concreta da trabalhadora, que presta a sua atividade laboral em nicho de alto risco de contágio pelo coronavírus (hospital).
Registrou, a propósito, ser incoerente “permitir que a gestante, albergada expressamente pela Lei Federal n. 14151/2021, que lhe assegura o afastamento das atividades de trabalho presencial, inclusive sem prejuízo de sua remuneração (e não de qualquer benefício previdenciário), seja exposta a uma condição de risco comprovadamente acentuada, isto é, o labor de gestante em unidade hospitalar voltada ao atendimento de pacientes infectados pelo coronavírus”.
A empresa alegava, ademais, que já não havia “quarentena” no Estado de São Paulo, de modo que a lei 14.151/21 não teria mais eficácia. A vice-presidência do Tribunal entendeu, todavia, que o conceito de quarentena – realmente finalizada ao ensejo do decreto estadual 65.897/21 – não se confunde com o de pandemia e com o respectivo estado de emergência pública de importância nacional, que deriva dos artigos 1º, caput, e 2º, II, da lei 13.979/20.
A preservação dos direitos trabalhistas, enfim, deve alcançar inclusive direitos de natureza convencional, como o direito às cestas básicas e aos tíquetes-refeição. No entendimento do desembargador Francisco Alberto Giordani:
“É razoável considerar que a vontade do legislador foi colocar esta gestante à disposição do empregador, para exercer todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal, na forma do art. 456, parágrafo único, da CLT; e, daí, a empregada-gestante, afastada por motivos sanitários ou profiláticos, em razão da pandemia, que não pode exercer a sua função presencialmente (por força do afastamento) ou remotamente (em razão da natureza da atividade), ainda que não presente no estabelecimento, deve ser considerada, na dicção do art. 1º, parágrafo único, da Lei n. 14.151/2021 c/c o art. 456, par. único, da CLT, à disposição do empregador. Por conseguinte, a litisconsorte está potencialmente em serviço, razão pela qual não cabe cogitação acerca da incidência das restrições das cláusulas 13 e 14 da CCT da categoria, id dc22528 de p.168/169-pdf, no sentido de retirar destas trabalhadoras o direito às mencionadas vantagens da cesta básica e do tíquete refeição, mesmo porque a obreira não pode ser punida por fato extraordinário que não deu causa.”
Processo: 0008199-37.2021.5.15.0000
Fonte: Migalhas