Há preponderância do interesse coletivo e da saúde pública sobre o interesse individual, baseado em convicções ideológicas, de não se vacinar contra a Covid-19, especialmente quando o empregado atua em clínica de cuidados a idosos.
Com esse entendimento, a 3ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por unanimidade, não constatando abuso de poder do empregador, afastou a aplicação da rescisão indireta e da indenização pretendida por uma cuidadora de idosos.
No caso, uma clínica de cuidados para idosos barrou, por duas vezes, uma funcionária que se recusou a comprovar a vacinação contra a Covid-19 alegando razões ideológicas. Diante das recusas, a empregadora a advertiu e depois suspendeu o seu contrato de trabalho.
A empregada, na sequência, moveu ação trabalhista pedindo o reconhecimento de rescisão indireta de seu contrato de trabalho, dizendo-se “vítima de assédio moral em razão de pressão interna da empresa para que ela se vacinasse contra a Covid-19”.
A Vara do Trabalho de Adamantina (SP) julgou o pedindo improcedente, levando a autora a recorrer da decisão. Nas razões do recurso, a ex-funcionária defende a autonomia da vontade para recusar-se a ser vacinada e discorda da forma como a empresa lidou com a situação, optando pela coação e constrangimento.
Em sua decisão, a desembargadora relatora, Rosemeire Uehara Tanaka, primeiramente pontuou que tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Ministério Público do Trabalho reconheceram a possibilidade de vacinação compulsória, permitindo, inclusive, medidas indiretas, como a restrição ao exercício de certas atividades.
Quando o trabalhador trabalha diretamente em contato com a classe mais vulnerável e letal ao vírus, ainda mais razão tem o empregador em restringir a presença no estabelecimento de funcionário que recusou a vacina, afirmou a magistrada, negando que o réu teria cometido abuso de poder.
“O fato de ter a autora permanecido no portão da clínica e se deparado com outras funcionárias que chegavam para o mesmo plantão não evidencia exposição violadora de bem imaterial, vez que o empregador apenas agiu no exercício regular de seu direito”, ressaltou a relatora.
Dessa forma, Tanaka afastou a configuração de rescisão indireta do contrato, mas, diferentemente do juízo de origem, entendeu que cabe ao julgador definir a modalidade de rescisão contratual.
A desembargadora concluiu que, como a propositura da ação revelou a intenção da autora na descontinuidade da relação de emprego e a atitude da ré foi justa, deve ocorrer a ruptura contratual por pedido de demissão da reclamante na data do ajuizamento da reclamação.
O advogado Fábio Medeiros, sócio da área trabalhista do escritório Lobo de Rizzo, acredita que a Justiça do Trabalho acertou ao privilegiar o coletivo e a responsabilidade maior que é sempre do empregador em relação ao ambiente de trabalho e demais pessoas nele presentes.
“Essa decisão, que pelo que sabemos seria a terceira no mesmo sentido na Justiça do Trabalho, embora seja ainda muito razoável pelo fato que a reclamante tinha como trabalho cuidar de pessoas idosas, ela é muito emblemática para todo e qualquer setor, porque tanto o juiz na primeira instância, quanto a Turma julgadora no TRT-15 foram precisos ao detalharem e fundamentarem as decisões não apenas com base no que decidiu o STF”, disse.
Para Medeiros, a decisão também acertou ao reiterar os pronunciamentos do MPT, no sentido que os empregadores podem e devem proibir empregados não vacinados de ingressarem nos ambientes de trabalho e, sendo o caso, até mesmo puni-los gradualmente com advertências, suspensões sem salário e dispensas por justa causa.
“Essas discussões, ao que parece, ainda estão longe de se encerrar. De qualquer forma, decisões como essa indicam claramente que a Justiça do Trabalho está posicionada ao lado da sociedade e dos empregadores na luta contra a pandemia e em favor da saúde e da vida”, concluiu o especialista.