Atualmente, um dos pedidos mais comuns nas ações que tramitam no Poder Judiciário, seja civil ou trabalhista, é a indenização por dano moral.

A base jurídica que assegura a tutela jurisdicional encontra-se na ideia de que tanto a pessoa jurídica como a física não podem ser moralmente prejudicadas, posto serem sujeitos de direitos, e, por esta razão, são titulares dos direitos de personalidade, não sendo admissível a prática de qualquer ato que os lesionem, pois acarretaria, a quem o praticou, uma sanção pecuniária.

Além deste sentido técnico patrimonial, tal direito encontra-se previsto na Constituição Federal de 1.988, que, de forma inovadora, criou, no artigo 5º, inciso V e X, a prerrogativa, para aquele que foi prejudicado de modo não patrimonial, de exigir reparação pela dor e humilhação.

Esta indenização, pela compreensão da doutrina e jurisprudência, possui caráter tanto punitivo, visto que tem por objetivo corrigir e prevenir que o sujeito pratique novamente o ato gerador da ofensa, e ainda de caráter compensatório, pois a consequência do mal é travestida em dinheiro, a fim de pagar pelo dano sofrido pela vítima.

Entretanto, neste aspecto, grandes discussões surgem a respeito dos valores a serem arbitrados pelo magistrado a título de indenização pelo dano moral, que muitas vezes excedem o âmbito da normalidade e equilíbrio, ou, em outras situações, são concedidas àqueles que não possuem tal direito, todavia o reivindicam por confundirem a sua dor e humilhação em dissabor, aborrecimento, mágoa etc, industrializando o dano moral.

E sobre isto trata este artigo. 

Da industrialização e do valor do dano moral 

O dano moral por ser um prejuízo causado aos direitos de personalidade da vítima, capazes de trazer sofrimento, dor, humilhação etc, não é passível de ser auferido materialmente, como se fosse um agravo causado a qualquer bem corpóreo, assim, o legislador concedeu ao magistrado o poder de arbitrar a quantia a ser paga a título de indenização por dano moral.

Não obstante, por mais que o juiz possua todo este poder está limitado a definir o quantum, posto que deve observar a posição social ou político do agente e da vítima, a intensidade da vontade de ofender e causar dano, que é determinado pelo dolo ou culpa, bem como a situação econômica do agente e da vítima, o risco criado em virtude da ação e omissão, a gravidade e a repercussão da ofensa[1].

Além dos requisitos narrados, o magistrado é guiado ainda pelo princípio da razoabilidade e da proporcionalidade[2], impedindo que, desta forma, sejam fixados valores exorbitantes ou até mesmo irrisórios.

Os princípios visam criar um critério de fixação do valor de modo justo e razoável, evitando que haja, por qualquer das partes, o enriquecimento ilícito, posto que o montante não pode ser fixado a ponto da vítima não precisar mais trabalhar, e nem que a punição não seja sentida pelo causador do dano.

Por esta razão, por mais que haja arbitrariedade e poder ao juiz para condenar o causador do dano a uma reparação em qualquer quantia a título de indenização por dano moral, deve sempre observar os critérios sociais do agente e da vítima, bem como os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, impedido a industrialização do dano moral.

Esta consiste em ações com pedidos imoderados da fixação da quantia a ser paga a título de danos morais, sendo, muitas vezes, inexistente tal direito, pois pode decorrer do mero dissabor, aborrecimento, que são normais no dia a dia de qualquer cidadão. Ocorre que em muitas das vezes os magistrados, a pedido das partes, julgam procedentes os pedidos, condenando o causador a uma indenização descomedida que deverá ser paga a vítima, capaz de gerar a esta o enriquecimento ilícito, ou seja, sendo condenado a uma quantia superior ao que de direito aquela possui, se é que possui.

Esses casos ocorrem ainda, infelizmente, com frequência. A única forma de finalizar tal arbitrariedade é com a observância pelos magistrados dos critérios objetivos, fixados pelos artigos 944 e 945 do Código Civil, quais sejam:

 I.  A extensão do dano;

II.  As condições socioeconômicas dos envolvidos; e

III O grau de culpabilidade do agente, da vítima ou de terceiro.

Não é possível se esquecer de que a indenização por dano moral tem caráter punitivo e pecuniário, assim, não se pode condenar o agente a uma quantia muito inferior, a ponto de achar que houve impunidade, bem como não pode ser exorbitante, a gerar o enriquecimento ilícito, deve ser concedido pelo magistrado na medida certa, através do sopesamento.

Todo e qualquer pedido de indenização a título de dano moral que seja oportunista ou até inócuos, que decorrem de mero aborrecimento diário, devem ser julgados improcedentes, como vemos de algumas decisões:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO MANTIDA. MERO ABORRECIMENTO. DANO MORAL. NÃO OCORRÊNCIA. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. ENUNCIADO 7 DA SÚMULA DO STJ. ENTENDIMENTO ADOTADO NESTA CORTE. VERBETE 83 DA SÚMULA DO STJ.

O Tribunal de origem, com base nos fatos e provas dos autos, comcluiu pela ocorrência de mero dissabor, afastando o dano moral. A revisão do entendimento adotado encontra óbice no verbete 7 da Súmula desta Corte.

(STJ, AgRg no AREsp 432443/SP – 2013/0378503-1, T4 – QUARTA TURMA, Ministra Rel. Maria Isabel Gallotti, DJe 06/03/2014, acesso em 10.12.2014)

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PRODUTO COM DEFEITO – RESTITUIÇÃO DE VALOR – MERO ABORRECIMENTO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.

A despeito do inegável transtorno e aborrecimento vivenciados pela autora, a recusa da apelada em substituir as peças necessárias, de modo a possibilitar a montagem do produto adquirido com defeito, não é capaz, por si só, de dar ensejo à configuração de um legítimo dano moral.

(TJ/MG, AC 10024102688207001/MG, 18ª Câmara Cível, Rel. Arnaldo Maciel, Dje 13/06/2014, acesso em 10.12.2014)

INDENIZAÇÃO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. MERO ABORRECIMENTO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS.

– Para a configuração do dano moral é imprescindível que a agressão atinja o sentimento íntimo e pessoal de dignidade do indivíduo. Os aborrecimentos decorrentes da frustração do contrato, da forma declinada nos autos, não implicam na obrigação de indenização por danos morais.

(TJ/MG, AC 10145120321321001/MG, 13ª CÂMARA CÍVEL, Rel. Cláudia Maia, Dje 30/08/2013, acesso em 10.12.2014)

E mais, frisa-se que o advogado possui grande importância na orientação ao cliente em relação à indenização por dano moral, pois aquele é o que primeiro manterá e orientará as partes, baseados em jurisprudências, quanto aos valores que são considerados demasiados para determinados casos concretos. Isto é, mostrarão quais são as hipóteses que não geram a indenização por dano moral, por configurar, por entendimento dos tribunais, mero dissabor, aborrecimento, mágoa etc, e quais são passíveis de indenização.

Assim, embora seja atribuição do juiz definir o quantum, cabe ao advogado conceder informações as partes sobre seus direitos, observando a gravidade e a repercussão da ofensa. E se presente os requisitos que caracterizam a concessão da reparação prosseguirá com a exigência da tutela jurisdicional.

Desta forma, é possível se observar que algumas pessoas ajuízam suas ações baseadas em pedidos de indenização por dano moral, com o argumento de que um mero aborrecimento, dissabor, mágoa, irritação, é um motivo de dor, humilhação, sendo que aquelas são suportadas pelo homem médio. Todavia, para que haja a concessão do direito previsto na Constituição Federal e no Código Civil é preciso sempre consultar um advogado para que ele possa fazer análise do caso concreto e, se presente os requisitos citados, propor a ação de reparação por dano moral.

 CONCLUSÃO

Como visto, está previsto na Constituição Federal, que possui como fundamento a dignidade da pessoa humana, a indenização pelos danos morais e materiais gerados contra a honra, à intimidade, à vida privada e à imagem das pessoas, obrigando o causador da ofensa à reparação pelos prejuízos causados.

Baseando-se no direito consagrado, o Código Civil repetiu em seus artigos 186, 187 e 927, o dever de indenizar os danos causados no âmbito extrapatrimonial. Entretanto, para a configuração do direito a reparação é essencial que haja a ação ou omissão do agente, o nexo de causalidade e ainda o dano, em alguns casos faz-se mister a culpabilidade, sendo em outros dispensados.

Não obstante, somente estes não são suficientes, posto ser necessário que o dano seja capaz de gerar dor, humilhação, não bastando apenas para a sua motivação o mero dissabor, a mágoa, o aborrecimento, que são situações vivenciadas cotidianamente pelo homem médio.

Caracterizada a violação à imagem, à honra, à intimidade e à vida privada de qualquer pessoa, nasce o dever de indenizar, posto o sujeito ter praticado um ato ilícito. E o valor desta condenação, que tem caráter punitivo e pecuniário, é arbitrado pelo magistrado. Contudo, para fixar indenização justa é preciso sempre observar os critérios objetivos, como a condição social da vítima e do ofensor, a extensão do dano, o grau de culpabilidade, bem como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois assim não formará a indenização pelo dano moral em uma indústria.

A industrialização do dano moral consiste na concessão de pedidos que foram formulados na petição inicial pelas partes com valores elevados, no qual muitas vezes o autor não possui tal direito, fundamentando no mero dissabor, mágoa, angústia, que não são admissíveis para a atribuição da tutela jurisdicional.

Todas as vezes que tal direito é concedido de forma anormal e desequilibrada existe ofensa à ordem jurídica, posto configurar o enriquecimento ilícito, que é vedado pelo nosso ordenamento, visto beneficiar aqueles que não possuem tal direito ou de forma superior aos que possuem.

Por esta razão, para evitar a insegurança jurídica, a injustiça e o enriquecimento ilícito, o magistrado deve se ater aos critérios objetivos, posto estes serem limites para a concessão da reparação em virtude do dano moral, respeitando a proporcionalidade, a razoabilidade e acima de tudo a justiça.

E mais, não se pode esquecer, que o advogado sempre auxilia na análise da reparação do dano moral, sopesando, de primeiro plano, através de informações jurídicas e jurisprudenciais, os valores que podem ser cobrados em vista do dano moral sofrido, evitando futuros indeferimentos e a industrialização do dano moral.

BIBLIOGRAFIA

AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil. 1987. Vol. II, p. 852.

MELLO DA SILVA, Wilson. O Dano Moral e a sua Reparação. 3ª Ed, 1999, nº 1.

RODRIGUES, Silva. Responsabilidade civil. – 20. Ed.- São Paulo: Saraiva, 2003.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro, v.7 – 20. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2006.

GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, v.4, São Paulo: Saraiva, 2006

[1] GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, v. 4, São Paulo: Saraiva, 2006, pag. 378.

[2] TJPR, Acórdão nº. 982, Proc. 133334-4, 7ª Câmara Cível, Rel. Des. Accácio Cambi, j. em 17.02.2003, Dje 10/03/2003, in http://www.tjpr.jus.br/, acesso em 02.05.2015.

Caroline de Jesus Alves

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