Apesar da perda de eficácia do artigo 15 da Lei 14.010/2020 –
segundo o qual, até 30 de outubro do ano passado, a prisão por falta de
pagamento de pensão alimentícia deveria ser cumprida exclusivamente na
modalidade domiciliar –, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
considerou que o contexto da pandemia da Covid-19 ainda não permite que o
devedor de alimentos seja encarcerado.
Entretanto, o colegiado garantiu ao credor dos alimentos – que, para a turma,
tem mais conhecimento sobre as características do devedor e o melhor modo de
fazê-lo cumprir a obrigação – decidir se será potencialmente mais eficaz o
regime domiciliar ou o adiamento da medida para posterior prisão fechada.
A relatora do habeas corpus, ministra Nancy Andrighi, explicou que, com a perda
de eficácia do artigo 15 da Lei 14.010/2020, atualmente, não há norma que
regule o modo pelo qual deverão ser cumpridas as prisões civis de devedores de
alimentos, especialmente porque a Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de
Justiça, mesmo após as prorrogações trazidas pelas Recomendações 68 e 78,
vigorou apenas até 12 de março de 2021.
Segundo a ministra, em razão do quadro social e humanitário ainda causado pela
pandemia, não é possível retomar a medida coativa extrema, “que, em muitas
situações, é suficiente para dobrar a renitência do devedor de alimentos,
sobretudo daquele contumaz e que reúne condições de adimplir a obrigação”.
Hipóteses diferentes
No entanto, Nancy Andrighi alertou para o fato de que também não se pode, em
todas as hipóteses, simplesmente adiar o cumprimento da prisão fechada para um
período futuro, pois não há previsão do momento em que ela poderá ser efetivada.
Por outro lado, ponderou, não se pode considerar automaticamente que o regime
domiciliar seja adequado em todos os casos, na medida em que existem inúmeras
situações nas quais essa modalidade de prisão será ineficaz.
A magistrada citou o exemplo de um devedor cujo trabalho exija deslocamento ou
que costume participar de aglomerações – casos em que a restrição de liberdade
ou a apreensão da CNH seriam medidas úteis. Outros, porém, trabalham
diariamente no sistema de home office e mantêm adequado distanciamento social –
hipótese em que a prisão domiciliar ou a restrição de descolamento seriam
infrutíferas.
Flexibilidade
Por todas essas razões, Nancy Andrighi entendeu ser necessário manter a
flexibilidade no tratamento do tema, dando ao credor o direito de optar pela
medida que compreenda ser a mais apropriada (cumprimento domiciliar ou
diferimento da prisão fechada).
Assim, no caso dos autos, a ministra determinou a intimação do credor dos
alimentos para indicar a sua escolha – sem prejuízo, em qualquer hipótese, da
aplicação (inclusive cumulativa e combinada) das medidas indutivas,
coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias previstas no artigo 139, inciso IV,
do Código de Processo Civil – de ofício, pelo juiz, ou a requerimento do
credor.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Fonte: AASP